sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Entrevistas Virtuais - César Vanucci

Entrevistas virtuais
Cesar Vanucci *
Era - Deia Leal - 2006

“Trazer de volta nossos heróis, nossos mitos!”
(Rogério Alvarenga, escritor)
Conheço o Rogério Alvarenga há um bocado de tempo. Nutro sincera admiração pelo seu valor intelectual. Sei muito bem que sua robusta cultura humanística é reforçada nas criações literárias, desde sempre, por elogiável preocupação pedagógica. Sua expressão verbal é posta assim constantemente a serviço da construção da cidadania.
Fixo-me numa situação específica da atividade desse escritor mode fortalecer o argumento. Uma interessantíssima obra recentemente trazida a lume. A torrente de idéias lançada exalta feitos e personagens que permitem a todos nós um acesso envolvente a inesperados desvãos de nossa trajetória como nação. Isso fica evidenciado nessa primorosa “Coletânea de entrevistas virtuais”, com foco em “gente que fez na história do Brasil”, elaborada com especial capricho pelo autor e endereçada a público leitor acostumado ao desfrute de boa e instrutiva  prosa literária.
Rogério explica que as entrevistas imaginárias com Tiradentes, Aleijadinho, Santos Dumont, JK, Fernão Dias Pais e Marília de Dirceu acham-se moldadas ao jeito de “um envolvimento guestáltico”, convertendo-se numa conversa franca, intimista e respeitosa. O formato literário adotado, intitulado entrevista virtual, não é comumente empregado, faz questão de esclarecer, adicionando ainda a informação de que o próprio termo “virtual” tem aporte fundamentado na informática, portentosa invenção destes tempos modernos. O que se quer com a coletânea de entrevistas é facilitar o estudo de personalidades que hajam se sobressaído no cenário nacional, “trazendo-as de volta para um relato esclarecedor de sua vida e de sua obra”, como acentua o escritor. O próprio Rogério retoma a palavra: “Isto mesmo! Trazer de volta! A justificativa é que os nossos heróis, nossos mitos, são pouco conhecidos, ou mesmo pouco considerados na esfera da configuração do ideário nacional.” O que acaba, naturalmente, remetendo ao reconhecimento – explica ainda – de que outros povos mantêm a autoestima em nível de supervalorização ininterrupta de seus heróis, de seus mitos, dos feitos de seus heróis. Tentar fazer o mesmo por aqui representa – como não? – uma contribuição valiosa para a elevação da autoestima nacional, numa ação de cidadania autêntica.
As entrevistas virtuais com alguns expoentes da cultura mineira, projetadas em livretos encorpados e disponíveis também em cd (áudio), mais do que intrigantes, são fascinantes. Os personagens “respondem” a perguntas curiosas. A Tiradentes, por exemplo, “pergunta-se”, entre outras coisas: Por que partes do seu corpo, depois do esquartejamento no Rio de Janeiro, foram hasteadas nos caminhos de Vila Rica? Por que não houve nenhuma reação do povo? Por que a mídia da época aplaudia essas reações do poder?
Já Aleijadinho, no depoimento “concedido”, revive a sua desdita e a sua glória. “Responde” a indagações como essas: Por que chamam você de Aleijadinho? Você tinha lepra?
A história referente a JK cuida de explicar pra quem não sabe a razão “desse ódio todo” concentrado na admirável figura do grande estadista brasileiro do século XX. Por que seus rancorosos inimigos resolveram cassá-lo? Por que esse baita temor de tanta gente pela sua presença no cenário político? As perguntas delineiam o quadro da ignomínia praticada com o construtor de Brasília.
As sagas de Santos Dumont, o homem que deu asas ao mundo, de Fernão Dias, o intimorato caçador de esmeraldas que alargou nossas fronteiras, da musa do Ouvidor da Corte, Marília, que conservou intato ardente amor pelo poeta Tomás Antônio Gonzaga, mesmo após o degredo que os afastou em vida para sempre, são também narradas em linguagem colorida, imaginosa e fluente. O criativo autor se vale de palavras repassadas de amorosidade, em tom reverencial, para destacar o esforço, que chama de compulsivo, das figuras retratadas em prol da edificação de um mundo melhor.
Sai-se admiravelmente bem na empreitada assumida. Estranha-me que obra tão palpitante e oportuna, que deveria estar sendo distribuída, entre outros pontos de leitura, nos colégios para a juventude em formação, passe assim tão despercebida à mídia incumbida da divulgação cultural e literária.

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