segunda-feira, 23 de maio de 2011

Crônica e Poesia de Vilma Cunha

Oh, Minas Gerais! Quem te conhece, não esquece jamais!..

Acadêmica VILMA CUNHA

{O hino mineiro tão bonito e cantado, letra de José Duduca Morais, e melodia adaptada da valsa italiana Viene sul Mare, não é considerado oficial. Uma judiação}...

Há muito, sonhava conhecer Diamantina. Terezinha, dama das excursões religiosas, estreou um projeto com roteiro novo,  convidou uma turma pra lá de especial, comandou o rebanho cor-de-rosa na competência de costume, e quem foi, regalou-se com beleza e cultura por 4 dias na terra do ilustre JK. Com direito a conhecer o Serro das Minas Gerais.

Sede de uma das 4 primeiras comarcas da Capitania das Minas, a antiga Vila do Príncipe do Serro Frio, hoje, cidade do Serro, ainda guarda as características das vilas setecentistas mineiras, o que lhe valeu ser o primeiro município brasileiro a ter seu conjunto arquitetônico e urbanístico tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em abril de 1938. Azul e branca, marca registrada  dos sobrados e casarões do nosso estado, a cidade exibe mineiridade, com cultura, beleza e filhos ilustres.  "É do Serro que sei que Minas em mim Vive ".(FrançaJúnior).

A descoberta de ricas jazidas de ouro próximas à cidade do Serro, entre os rios Grande e Piruruca, atraiu os primeiros exploradores à região da atual Diamantina. Em 1713, foi fundado o Arraial do Tijuco (que em tupi, significa lama). O grande impulso para o crescimento urbano e econômico do arraial foi a descoberta de jazidas de diamante por volta de 1720. Bernardo da Fonseca Lobo, reconhecido como o primeiro a encontrar a pedra, levou em 1726 alguns diamantes ao governador da província, sediada em Ouro Preto , e a notícia logo chegou à Coroa Portuguesa. Em 1729, o rei D. João V cancelou todas as concessões e instituiu o monopólio particular na extração da pedra, que até então vinha sendo explorada livremente. Foi fundado o Distrito Diamantino, com sede no Tijuco e subordinado à comarca do Serro Frio, para oficializar o controle da extração. A partir da segunda metade do século XIX, Diamantina inicia um período de decadência econômica com o esgotamento das jazidas. Intensificou-se então a agricultura de subsistência apesar do relevo pedregoso, e no início do século XX, a indústria têxtil surgiu como nova opção econômica.

A cidade calçada com pedras pelos escravos, sobe e desce ladeiras ostentando sobrados e casarões imponentes, entregando a belíssima origem portuguesa. Ainda que as ruas e becos estreitos do centro tenham também o traçado irregular que caracteriza outras cidades da época, Diamantina apresenta algumas características só dela. Há poucas praças e não se vê grandes prédios públicos. A arquitetura das igrejas também é diferente de outras cidades históricas. O estilo é simples e elegante. 
Monumentos Civis: Mercado dos Tropeiros; Casa de Juscelino Kubitschek; Casa da Glória e Passadiço; Casa de Chica da Silva; Casa do Padre Rolim (Museu do Diamante); Casarão do Fórum; Casa do Muxarabiê; Rua do Burgalhau;Casa da Intendência (Prefeitura)
Monumentos Religiosos: Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos; Igreja São Francisco de Assis; Igreja Nossa Senhora do Carmo; Catedral Metropolitana de Santo Antônio; Igreja Nosso Senhor do Bonfim; Igreja Nossa Senhora das Mercês; Igreja da Luz; Capela Imperial do Amparo; Basílica do Sagrado Coração de Jesus.

Diamantina é pluricultural. As artes se dão as mãos e dançam a ciranda da rica história. Diamantina canta nas ruas, nas escolas, em saraus nas igrejas centenárias, nas serestas, toca nas Vesperatas famosas, não nega o berço que embalou o belo. Zela pela memória preciosa.

 Arte Miúda, Curso Livre de Arte Integrada, fundado em 1988 por Soraya Araújo Ferreira Alcântara e Maria Eunice Ribeiro Lacerda, tem como objetivo despertar o interesse e a sensibilidade da criança (a partir dos 03 anos de idade) e do adolescente pela arte, por meio da integração  das artes (plásticas, cênicas, musicais e dança), em ambiente propício ao desenvolvimento da criatividade e da descoberta do talento artístico. A Escola desenvolve diversos projetos, com destaque para o resgate e a divulgação da cultura de Diamantina e região. O Projeto “Memória Musical” cultiva e divulga a tradição seresteira de Diamantina com o Grupo de Seresta Infanto-Juvenil que se apresenta para turistas e nativos encantados e também em diversas cidades brasileiras Vimos um espetáculo grandioso.
Semana que vem vou contar!






Amor de Maio
Vilma Cunha
 
O céu chorando em maio
Ensopando a noite lá fora
Pena, meu Pai qual seria?

Chuva alegre meu poeta
De banhar as laranjeiras
Seus botões com poesia

Pai milagreiro das Bodas
Com os cântaros de amor
Sacramentando harmonia 

Poeta, aroma o teu verso
No doce encanto de maio
Hás de incensar a alegria

Um Verdadeiro Humanista

Um verdadeiro humanista

Cesar Vanucci *

“Quem não gosta do Brasil não me interessa.”
(Gilberto Amado)

Tantas coisas ditas e tantas ainda a dizer sobre JA. Reservo-me o direito de, pra frente, voltar a registrar, atos, fatos, ditos e feitos que possam ser incorporados à saga desse personagem fascinante.

O que desejo, por agora, no arremate desta sequencia de artigos, em que me esforcei por pincelar algumas facetas de sua cintilante trajetória, é sublinhar o caráter humanístico que norteou as fecundas ações nesta sua peregrinação pela pátria terrena. Já foi falado, mas não fica demais repetir (a repetição, como atestava Napoleão, é sempre a melhor retórica): o legado deixado por Alencar servirá, com certeza, de inspiração pra muita gente.

Do povoado de Itamuri ao Palácio do Jaburu, chão a perder de vista na extenuante caminhada, o cidadão de infância humilde daquela paisagem roceira, que veio a exercer nos cenários majestosos e refinados do poder funções que tão forte influência tiveram nos destinos de seus compatriotas, soube conservar íntegros os valores e crenças adquiridos no aconchego familiar. Manteve-se fiel às raízes. Os aconselhamentos paternos valeram-lhe de farol na caminhada. “O importante na vida, meu filho, é poder voltar”, foi o que lhe disse o pai, Antônio, no dia em que o abençoou em sua partida rumo a centro maior na busca de “lugar ao sol.”

Alencar madrugou no trabalho, começando por tarefas bem modestas. À custa de invulgares talento e capacidade empreendedora, construiu, palmo a palmo, reluzente carreira. De balconista a pequeno comerciante. Na atividade industrial, despontada adiante, percorreu longo e árduo itinerário até chegar à posição de realce assumida no panorama empresarial.

A crença humanística impregnava seu comportamento. No trabalho, pontilhado de conquistas sociais enriquecedoras. No lar, construído com a ajuda inestimável e decisiva de dona Marisa, companheira resoluta, dama de acrisoladas virtudes, mulher forte na inteireza evangélica. Na vida pública inatacável, reconhecida na reverência das ruas, a partir, sobretudo, do momento em que galgou a Vice-Presidência e criou, com sua inteligência descortinadora, uma forma muito peculiar, descontraída, franca, bem humorada, de dialogar com a sociedade em torno de questões palpitantes. Na doença inclemente, em que tocou a todos com sua inabalável disposição de seguir em frente.

Alencar preencheu com atitudes e palavras, botando pra fora seu apego a valores humanísticos e espirituais que conferem dignidade à aventura humana, um espaço na paisagem política que é hoje percebido pelos seus patricios como uma referência de vida, valendo de exemplo e inspiração.

Foi um compatriota que soube olhar o Brasil, o jeito de ser de sua gente, com sentimento de brasilidade. Pensava como Gilberto Amado: “Quem não gosta do Brasil não me interessa.” Sentia-se em desagrado com essas pessoas que, contemplando nossa realidade, nossas lutas e conquistas, procedem como aqueles indivíduos mórbidos pela própria natureza que, diante da magnitude do mar, só têm palavras para o enjôo, conforme a anotação crítica de Louis Pauwells.

Deixei por último uma revelação danada de intrigante, de certo modo inédita, já que nunca registrada publicamente, envolvendo uma previsão feita por Neila Alckmin a este desajeitado escriba numa manhã nevoenta de fevereiro do ano de 1990. As circunstâncias que me colocaram frente a frente com a famosa sensitiva, de saudosa memória, em Conceição do Rio Verde, foram, pra dizer o mínimo, intrigantes. Deixo para outra ocasião essa parte do relato. O que desejo sublinhar é o seguinte: Neila antecipou, surpreendentemente, num papo com duração bastante extensa, que o dirigente maior da entidade em que eu trabalhava – a Fiemg – estava vocacionado a cumprir, num futuro próximo, uma missão de notável relevo na cena pública brasileira. Lembro-me de ter-lhe indagado, na ocasião, relutando, inconscientemente, de certa maneira, em acatar seu vaticínio, por que não dera certo a previsão que fizera acerca da eleição do Afif Domingos no pleito presidencial recém-findo. Ela não demonstrou melindrar-se com a pergunta. Limitou-se a explicar que fora mal interpretada no tocante ao fato, que rendeu, como é sabido, vasto comentário crítico na época.

Depois deste encontro, antes de sua partida, falei com Neila por mais três vezes. Todas por telefone. Ela sustentou, convictamente, o que havia dito acerca do futuro papel político de Alencar na história brasileira.

* Jornalista (cantonius@click21.com.br)

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Artigo do Acadêmico César Vanucci

Cartas do médico Guimarães

 Por CÉSAR VANUCCI
“Uma pequena preciosidade.”
(José Dias Lara, escritor, estudioso da obra de Guimarães Rosa)


R
etorno a um personagem fascinante. Correspondência de um amigo traz Guimarães Rosa de volta a este espaço. Como devem se recordar os leitores, em três crônicas sucessivas – “Guimarães Rosa”, “Confissão de Guimarães” e “Acontecências paranormais” -, andei deitando falação acerca dos insuspeitados, singulares, e, como se viu depois, confessos dons de percepção extrasensorial do genial escritor. As considerações alinhadas se basearam num artigo, de 40 anos atrás, em que o próprio Guima narra suas incríveis experiências nessa enigmática seara. O artigo me foi encaminhado por um grande amigo, o escritor e historiador Luiz de Paula Ferreira, um dos maiores empresários do ramo têxtil da América Latina.

Das crônicas aqui estampadas tomou conhecimento o respeitado homem de letras José Dias Lara, ex-governador do Lions, educador emérito, membro da Academia Mineira de Leonismo, onde ocupa a cadeira que tem Guimarães Rosa como patrono. Estudioso das coisas ligadas ao encantador universo rosiano, Lara detém valiosas informações sobre a vida e a obra do autor de “Grande Sertão, Veredas”. Numa amável correspondência, registra sua surpresa diante do artigo de Guimarães: “O tal artigo, de 40 anos atrás – que desconhecia – talvez seja mais uma das excentricidades do velho Guima, que ele as tinha em bom número”. No desdobramento da mensagem, presenteia-me, conforme suas palavras, com “uma pequena preciosidade”.

Ouçamos de sua própria boca as explicações: “Sabe-se que Guimarães era de falar pouco e escrever muito, particularmente cartas: era um missivista de escol. E isto já fazia, bem antes de tornar-se o notável escritor que todos conhecemos. Ainda era o dr. João, médico em Itaguara, nos idos de 1932; são desse tempo as cartas de que lhe envio algumas cópias – uma pequena preciosidade – uma delas até com uma fórmula medicamentosa para manipular. Linguagem simples para seu povo muito simples. Eram os primeiros passos de um bom médico, que se fez grande nas letras nacionais.”

O destinatário de todas as cartas, redigidas pela ortografia da época, datadas de 1932, a caligrafia firme e desenvolta, é um senhor de nome Manoel, residente no Mambre, próximo a Itaguara, onde o médico Guimarães Rosa clinicava. Em tom assaz cordial, evidenciando o grau de amizade existente entre os dois, Rosa acompanha o tratamento de pessoa próxima ao companheiro Manoel. Indica procedimentos terapêuticos incluindo aí, até mesmo, receitas médicas caseiras, de uso corrente naqueles tempos. Abaixo a reprodução das duas primeiras cartas-receitas. As outras ficam para depois.
“Itaguara, 22 maio 932  Prezado Manoel,  Abraços, Seguem os apetrechos. Faça o serviço com jeito, e mande-me a ferramenta logo depois. Explique ao povo da casa o modo de usar os remédios.
Recomende quanto à hygiene. Mande fazer também uma lavagem intestinal. Será bom você mandar-me uma informaçãozinha por escripto. Recomendações aos seus. Abrace por mim o velho. Estou com saudade do agradável Mambre e, principalmente, dos seus bondosos moradores. Muito grato por todas as finezas; desculpe-me os incômodos. Do amigo   J. Guimarães Rosa”

“Prezado Manoel  Cumprimentos aos seus. Continue a mandar fazer as lavagens intestinaes, bem como as vaginaes. A doente deve tomar, na maior quantidade possível, chá de cabellos de milho adoçado. A alimentação deve ser reforçada, com prudência, porem. Um apertado abraço do amigo Guimarães Rosa.!




Receitas de Rosa





“... aplicar angús quentes no logar da dor.”
(Prescrição do dr. João Guimarães Rosa)

E

 sta crônica ocupa-se de textos inéditos de Guimarães Rosa datados de 1932. Não se trata, já vimos, de escritos literários, mas de mensagens coloquiais, em tom afetuoso, assinadas pelo médico dr. João Guimarães Rosa. Ele exercia a profissão em Itaguara, interior deste imenso país das Geraes. O destinatário, amigo dileto, era o fazendeiro Manoel Carvalho, chefe político conceituado na região. A fazenda Mambre, citada várias vezes nas correspondências, ficava localizada na divisa de Itaguara e Itatiaiuçu.

Em carta de 25 de maio de 32, Guima refere-se ao amigo como “um bom enfermeiro e um bom informador” e recomenda à paciente sob seus cuidados “lavagem intestinal” com “água fervida, ou cozimento de rosas”. Este o texto:
“Itaguara, 25 de maio de 932  Prezado Manoel, Um abraço apertado. Primeiramente, ardorosos parabens, pois você tem sido um bom enfermeiro e bom informador. Quanto à doente: Deve ir se alimentando com canjas, caldo de frango, mingáu de fubá com leite, café com leite, sopa de macarrão bem cozido, etc, porque a moléstia é demorada e a doente necessita de manter as forças. Mesmo sem appetite, deve insistir. Deve fazer nova lavagem intestinal, com litro de água fervida, ou cozimento de rosas. Vão novos papeis para lavagens vaginaes. A injecção não póde falhar nenhum dia  amanhã póde falhar a informação, só isso. Quando a febre estiver mais alta, a doente deverá tomar um banho morno de corpo todo, enxugando-se bem depois. Os remédios (poções) devem ser tomados sem interrupção, e, terminado o conteúdo dos vidros deve vir o portador para reformal-os. Continue: - Hygiene.... Hygiene.... si fôr possível. Abrace todos os seus em meu nome. Do amigo Guimarães Rosa.”
Na carta seguinte, 29 de maio, expressa muito carinho pelo pessoal da fazenda.

“Distinto Manoel, Gloria! Fico bem satisfeito de saber das melhoras apresentadas pela doente – melhoras devidas em parte aos cuidados enérgicos do amigo, que tem sabido informar-me magnificamente da marcha da moléstia. Si as dores nas pernas continuarem, veja si há alguma novidade no local dolorido (inchação branca e dura), pois pode tratar-se de uma phlebite puerperial. De qualquer maneira, caso a dôr continúe, a doente deverá manter-se em repouso rigorosissimo, podendo applicar angús quentes no logar da dor. No mais, continue, que está bem orientado. Distribua um punhado de abraços entre o pessoal do Mambre, sendo um abraço maior para o seu Chico e um outro para você. Até outra vez. Guimarães Rosa.”

Na missiva posterior (03.06.1932) Guimarães Rosa prescreve uma receita caseira, indicando os ingredientes da manipulação a ser feita.
“Prezadissimo Manoel  Cordiais cumprimentos. Seguem novos remédios para a enferma. É preciso que ella vá se alimentando bem, com as devidas cautelas, naturalmente, para que a causa não desande em vez de andar. Não deixe de mandar informações por mais uns três dias, principalmente temperatura e pulso. Mande fazer diariamente uma lavagem intestinal. E, fallo sem intuito de envaidecel-o, póde você estar certo de que a cura da doente deverá, em grande parte, ser agradecida ao enfermeiro. Pudesse eu ter sempre á mão um auxiliar assim! Quanto á crioula, si você quizer experimentar ainda, póde dar a ella: Uso interno Elatério  -  0,50 .....; Rhuibarbo preto  -  1,0 gr; Estr. de fel de boi  -  qsp para 20 pilulas. Dar 1 de 2/2 horas. Conjuntamente devem ser dadas umas 3 injecções de óleo camphorado. Provavelmente o resultado será bom. Até breve. Abraça por mim a todos os mambrenses, principalmente o velho. Do amigo Guimarães Rosa  Itaguara, 3 de junho de 932.”

Interessantíssima, sem dúvida, essa série de cartas-receitas que o professor José Dias Lara, estudioso da vida e obra de Guimarães Rosa, traz ao conhecimento dos leitores por intermédio deste seu admirador e amigo.

* Jornalista (cantonius@click21.com.br)