quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Cátedra da Esperança - por Cesar Vanucci

MEMBRO EFETIVO DA ACADEMIA MUNICIPALISTA DE LETRAS DE MINAS GERAIS

Cátedra da esperança

Cesar Vanucci *

“A cultura humanística exige
a mais intensa vida interior...”
(Unamuno)

A Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais (Amulmig), presidida pela escritora Elisabeth Rennó, recepcionou, condignamente, em concorrida assembléia, o escritor e poeta Maurício Braga de Mendonça. Natural de Brazópolis, a encantadora “cidade presépio” incrustada nas fraldas da Mantiqueira, sul das Gerais, o novo acadêmico, procurador de justiça aposentado, é cidadão com trajetória cintilante na vida comunitária.
Culto, probo, ético, competente, é apontado na convivência profissional e social como alguém bastante especial. Um personagem que conhece de sobra a missão que lhe toca desempenhar na peregrinação pela pátria terrena. Alguém verdadeiramente afeito às responsabilidades sociais exigidas das pessoas de boa vontade nestes tempos conturbados.
A historinha que passo a relatar fala sugestivamente dos valores de referência a que Mauricio habitualmente recorre na conduta comportamental. Fala, igualmente, de sua percepção social diante das coisas do mundo.
O país enfrentava, naquele tempo, uma inflação sem freios. Lançando mão de medidas extremas para debelá-la, o governo pediu o empenho leal de todos no sentido de poder combater os exageros ostensivamente praticados nos preços dos artigos de consumo. A lei de economia popular enquadrou, naquela localidade – pólo econômico, político e cultural da região – alguns infratores. No geral, pequenos feirantes. Jornal da cidade, comentando o fato, ressaltou situação paradoxal e injusta: enquanto comerciantes miúdos eram processados, o presidente de uma poderosa organização fazia questão fechada de anunciar, arrogantemente, em tom provocativo, que a rede varejista sob seu comando iria praticar tão somente preços por ele próprio fixados. Não os da tabela da Sunab.
O Promotor, que outro não era senão o já citado acadêmico, resolveu entrar de sola na questão. Pediu abertura de inquérito contra quem tão ostensivamente desafiava a lei. A Polícia Federal agiu. O infrator todo poderoso, criminalmente qualificado no cartório competente, teve que baixar, como se diz no popular, o facho... Grupo influente da cidade, composto de negociantes abastados e políticos emproados, que se mantivera mudo e quedo que nem penedo quando dos enquadramentos dos pequenos feirantes, resolveu, então, encaminhar ao altivo representante do Ministério Público um manifesto criticando o indiciamento do colega. O manifesto foi rasgado em mil pedacinhos, lançados na cesta de lixo. A lição pedagogicamente aplicada por Mauricio a viventes que não passavam de contumazes detentores de odiosos privilégios, assegurados pelo exercício distorcido do poder, ganhou receptividade a mais calorosa nos demais segmentos da comunidade.
Ingressando no Ministério Público em 1972, Mauricio galgou 20 anos mais tarde, depois de elogiável trabalho em seis diferentes comarcas, o colégio de Procuradores da Justiça. Ao longo de sua atuação na Justiça e magistério, notabilizou-se por alentada prestação de serviços à causa da cultura humanística. Entende, adotando como prática pessoal e propagando como ensinamento, que a cultura é processo dinâmico de aquisição de informações que norteiam as relações das pessoas, exigindo dos intelectuais, como propõe Unamuno em seus “Solilóquios”, “a mais intensa vida interior, a de mais batalha,  a de mais inquietação...”
Escritor de méritos, brindou-nos no livro “Ministério dos Causos Públicos”, prosa refinada, referta de verve, com relatos saborosíssimos de acontecências recolhidas no trepidante dia-a-dia das ruas, que são o lugar onde melhor a alma generosa da gente do povo se dá a conhecer.
Revelou-se, também, poeta. Quer dizer, um “contemporâneo do futuro”. Um cara talentoso, com a intuição permanentemente aflorada, que costuma ouvir e ver as coisas primeiro, como é próprio dos poetas. Um vivente que sabe assumir, pra valer, em versos ditados pelo coração, a cátedra da esperança.
Dá provas disso neste sonoro manifesto de celebração da vida expresso em versos do poema “Dia Universal da Terra”:  “Que se abracem os oceanos / Que se calem os desenganos / Porque hoje é o Dia da Terra!” (...) / “Que cantem os rios, as matas, os vales / Paire o bem sobre todos os males / Porque hoje é o Dia da Terra!” (...) / “Que as guerras, as brigas, as desavenças / Dêem lugar a Paz em todas as crenças / Porque hoje é o Dia da Terra!(...)
Ou, ainda, nesse impulso encharcado de ternura de alguém que se confessa apaixonado como se estivesse entoando prece, do poema “Milagre”: “Eu  vi! / ( e nisso ninguém crê...) /Um sorriso do Crucificado / Quando aos seus pés ajoelhado / Implorei-lhe apaixonado / Que me desse você! / Eu ouvi! / ( e nisso ninguém crê...) / Jesus Cristo me dizer / Num leve e doce prazer / “ - Você dela vai ser / E Ela será só de você !!!”
O ingresso de Maurício na Amulmig assegura, sem sombra de dúvida, a certeza de preciosa contribuição pessoal ao patrimônio de saberes acumulados da valorosa instituição.

* Jornalista (cantonius@click21.com.br)

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